sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

ANSEIOS - Rafael Rocha – Do livro ”POEMAS ESCOLHIDOS”

Se eu tiver anseios de voar à lua
Terei de criar um míssil de estrelas
Alçando voo tenho de sabê-las
Para a rima não sair tão crua
Dentro da paisagem noturnal.

Sem a rima farei uma viagem
No farrapo de um velho cometa
Centelhando em busca de uma meta
Do tesouro sem ouro ou miragem
Qualquer coisa natural.

A lua poderá ser o corpo leve
Da mulher que acondicionou
Meu nome, meu sexo e meu amor
Abrindo alas à chuva e à neve
Para a paixão outonal.

De Ícaro ganharei asas modernas
À esta sede de voar na emoção
De uma nova e límpida canção
O tempo novo e as almas hodiernas
Marcam o caminho do final.

Tendo anseios de voar à noite
Com asas macias e mais leves
Da poesia dessas coisas breves
Homem estarei sempre em pernoite
No teu corpo, minha amada casual.

Canta em mim o vício da paixão
E a máxima de quando é se entregar
Na vertigem do prazer de amar
Gosto de perder a razão
E ser eterno, único e total.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

PASSO - Antonio Carlos Gomes

Passo
Sou limitado
Não deixo marcas
Nem saudades
A vida é passar
E evaporar

Quantas espécies
E quantas eras
Passaram
No pequeno mundo?

Não há marcas
Nem saudades

Sem registros
Não há nomes

Sem nomes
Não há passagens

Passo
Apenas passo
Não há porque aparecer
Pois a única realidade
É o perecer

Sem deixar saudades

SE EU MORRER AMANHÃ – Valdeci Ferraz

Se eu morrer amanhã morrerei feliz
Porque minha amada beijou-me a face
E um amigo deu-me um abraço.

Se eu morrer amanhã morrerei feliz 
Porque os meus olhos contemplaram a alva
E a última nota se harmonizou em um acorde perfeito.

A minha fantasia deixo aos loucos
Os meus versos aos excluídos
E o meu sorriso para as carpideiras

Meu corpo inerte guardará todos os segredos
E o beija-flor sugará de todas as flores
As lágrimas que verti pela ausência de alguém

Deitar-se-á comigo a iniludível
E não haverá tempo para um último tango
Porque as mãos sobre o peito já não poderão falar.

Se eu morrer amanhã morrerei feliz
Porque a noite sempre será a minha amiga
Sua voz estará sempre sussurrando ao meu ouvido:

- Valeu poeta!

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

INSTITUTO DE LETRAS - Priscila Fernandes


As mulheres do instituto de letras
têm voz de canivete.

As mulheres do instituto de letras
da Universidade Federal
têm muito a gritar.

As mulheres do instituto de letras
da Universidade Federal da Bahia
morrerão um dia desses:
de câncer na garganta.

Como tem mulheres!
Como são das mulheres as letras,
a palavra, os ganidos.

Não sei como ainda restam vidros
e ouvidos
àquele bendito instituto.

CANTIGAS DE CABARÉ – Vânia Melo


Beijava a cara com um jeito de louco
Envolvia nas pernas, assim meio torto
Falava ao ouvido um segredo rouco
Suado, calado, caia meio morto

Fazia juras ocultas, assim meio bobo
Apertava malvado, batia um pouco
Como quem nada quer olhava seu braço
E com um gesto grosseiro jogava o laço

Pouco a pouco se ia no mesmo passo
Deixava um trocado e se ria palhaço
Saía contente, bêbado, em descompasso

Ficava sozinha, ligava a vitrola
Ouvia cantigas e cantarolas
Que falavam de mar e iam embora.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

PASSO PASSARÁ - Clodair Eduão Farias

Passa ano, morre ano
passos na estrada
pés no caminho
nova caminhada.
Viver novas horas 
sentir mudança nos dias
e agora as histórias
corre atràs das correrias.
Geração de quê?
fazer e desmanchar
nada de concreto
tudo pra consertar.
Abrir cacimbas
encher cabaças
um rio em correnteza
esperteza e trapaças.