quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

SINFONIA DE UMA NOITE INQUIETA – Bernardo Soares (Um dos heterônimos de Fernando Pessoa)

Dormia tudo como se o universo fosse um erro: e o vento, flutuando incerto, era uma bandeira sem forma desfraldada sobre um quartel sem ser. Esfarrapava-se coisa nenhuma no ar alto e forte, e os caixilhos das janelas sacudiam os vidros para que a extremidade se ouvisse. No fundo de tudo, calada, a noite era o túmulo de Deus (a alma sofria com pena de Deus). E, de repente, – nova ordem das coisas universais agia sobre a cidade – o vento assobiava no intervalo do vento e havia uma noção dormida de muitas agitações na altura. Depois a noite fechava-se como um alçapão, e um grande sossego fazia vontade de ter estado a dormir.

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