quinta-feira, 24 de novembro de 2016

DIZ-ME A VERDADE ACERCA DO AMOR – W. H. Auden

Tradução de Roberto Susuki

Há quem diga que o amor é um rapazinho,
e quem diga que ele é um pássaro;
há quem diga que faz o mundo girar,
e quem diga que é um absurdo,
e quando perguntei ao meu vizinho,
que tinha ar de quem sabia,
a sua mulher zangou-se mesmo muito,
e disse que isso não servia para nada.

Será parecido com uns pijamas, 

ou com o presunto num hotel de abstinência?
O seu odor faz lembrar o dos lamas,
ou tem um cheiro agradável?
É áspero ao tato como uma sebe espinhosa
ou é fofo como um edredom de penas? 
É cortante ou muito polido nos seus bordos? 
Ah, diz-me a verdade acerca do amor. 

Os nossos livros de história fazem-lhe referências 
em curtas notas críticas, 
é um assunto de conversa muito vulgar 
nos transatlânticos; 
descobri que o assunto era mencionado 
em relatos de suicidas, 
e até o vi escrevinhado 
nas costas dos guias ferroviários. 

Uiva como um cão de Alsácia esfomeado, 
ou ribomba como uma banda militar? 
Poderá alguém fazer uma imitação perfeita 
com um serrote ou um Steinway de concerto? 
O seu canto é estrondoso nas festas? 
Ou gosta apenas de música clássica? 
Interrompe-se quando queremos estar sossegados? 
Ah! diz-me a verdade acerca do amor. 

Espreitei a casa de verão, 
e não estava lá, 
Tentei o Tâmisa em Maidenhead 
e o ar tonificante de Brighton, 
não sei o que cantava o melro, 
ou o que a tulipa dizia; 
mas não estava na capoeira, 
nem debaixo da cama. 

Fará esgares extraordinários? 
Enjoa sempre num balouçar? 
Passa todo o seu tempo nas corridas? 
Ou a tocar violino em pedaços de cordel? 
Tem ideias próprias sobre o dinheiro? 
Pensa ser o patriotismo suficiente? 
As suas histórias são vulgares mas divertidas? 
Ah, diz-me a verdade acerca do amor. 

Chega sem avisar no instante 
em que meto o dedo no nariz? 
Virá bater-me à porta de manhã, 
ou pisar-me os pés no ônibus? 
Virá como uma súbita mudança de tempo? 
O seu acolhimento será rude ou delicado? 
Virá alterar toda a minha vida? 
Ah, diz-me a verdade acerca do amor.

Um comentário:

  1. Ninguém conseguirá dizer a verdade acerca do amor. Ele chega, infiltra-se, agarra-nos, tira-nos a capacidade de análise, domina-nos
    por completo!
    Os meus cumprimentos.
    Irene Alves

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