segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

UM POEMA DE AMOR - Nicolas Guillén

Tradução de João G. Paiva

Não sei. Ignoro.
Desconheço o tempo que andei
sem novamente encontrá-la.
Talvez um século? Acaso.
Talvez um pouco menos: noventa e nove anos?
Ou um mês? Poderia ser. De qualquer forma,
um tempo enorme, enorme, enorme.
Ao fim como uma rosa súbita,
repentina campânula trêmula,
a notícia.
Saber logo
que iria vê-la outra vez, que lá teria
perto, tangível, real, como nos sonhos.
Que trovão surdo
rodando-me nas veias,
estalando acima
em meu sangue, em uma
noturna tempestade!
E o achado, em seguida? E a maneira
que ninguém compreendera
ser nossa própria maneira?
Um toque apenas, um contato elétrico,
um aperto conspirativo, uma visão,
um palpitar de coração
gritando, gritando com silenciosa voz.
Depois
(Sabes mesmo desde teus quinze anos)
esse tatear de palavras presas,
palavras de olhos caídos,
penitenciais,
entre testemunhas e inimigos,
todavia
um amor de “te amo”
de “você”, de “bem quisera,
mas é impossível…” De “não podemos,
não, pense melhor…”
É um amor assim,
é um amor de abismo em primavera,
cortês, cordial, feliz, fatal.
A despedida, logo,
genérica,
na tempestade de amigos.
Vê-la partir e amá-la como nunca;
segui-la com os olhos,
e já sem olhos seguir vendo-a longe,
bem longe, e ainda segui-la
mais longe todavia,
feito a noite,
de mordidas, beijos, insônia,
veneno, êxtase, convulsões,
suspiro, sangue, morte…
Feita
dessa matéria conhecida
com que amassamos uma estrela.

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