domingo, 8 de julho de 2018

O MORTO – Paulo Mendes Campos



Por que celeste transtorno
tarda-me o cosmo do sangue
o óleo grosso do morto?

Por que ver pelo meu olho?
Por que usar o meu corpo?
Se eu sou vivo e ele morto?

Por que pacto inconsentido
(ou miserável acordo)
Aninhou-se em mim o morto?

Que prazer mais decomposto
faz do meu peito intermédio
do peito ausente do morto?

Por que a tara do morto
é inserir sua pele
entre o meu e o outro corpo.

Se for do gosto do morto
o que como com desgosto
come o morto em minha boca.

Que secreto desacordo!
ser apenas o entreposto
de um corpo vivo e outro morto! 

Ele é que é cheio, eu sou oco.

Nenhum comentário:

Postar um comentário