(Canto Primeiro)
Cheguei até este limiar cheio de
mim
Profetizando a dor escondida dos
homens.
E delimitando no infinito do
horizonte
Marcos e marcas para todos os
viajantes
E neste limiar que pretende ser
eterno
Profetizo o verso ainda não posto
à mesa.
................................................................................
(1)
O povo não é mais pescador dele mesmo.
Arrasta a maldição da dor devido aos gestos estudados
De quem ocupa a tribuna e se diz autoridade.
O povo vive de restos malditos
E nasce em berço muito pouco esplêndido.
Não pretendo atirar a primeira pedra.
Prefiro denunciar ao mundo a ganância dos chefes.
Não pretendo aceitar os ditames da última era.
Debruçarei meu corpo nos balaustres das pontes
Atentarei meu olhar nos rios sujos da cidade.
E tentarei falar a voz humana: “Sou pobre, mas honesto”.
Nem mais isso os meus queridos devem no balcão da vida.
(2)
Hipócritas
Outros homens dizem possuir a voz de Deus
E abrem o livro sagrado para fundar igrejas
E corromper a mente dos ignaros,
Vendendo a fé como uma sopa
E a crença como um pão adocicado.
A justiça fica adormecida em seus palácios
Fazendo ouvidos moucos à pregação
Inconveniente da ideia do Senhor.
Eles consagram os vendilhões do templo
E beijam a moeda retirada do bolso do pobre.
Este é um novo ritual
A fazer do inalcançável a ilusão alcançada
E comprada como um sapato ou um trago de cachaça.
Ladrões da inocência!
A espada dos honestos ainda irá perfurar
Seus imensos corpanzis de mentira e sujeira.
(3)
Ah, terra minha! Ah, gente minha!
Vamos agitar nossa força nas estradas!
Vamos partir e subir aos mais altos andares!
Vamos agarrar nossas aspirações na marra!
Túmulos não foram feitos apenas
Para quem não tem onde morrer de fome.
E a Pátria Nordeste ainda não foi
De todo descoberta como ela merece.
Escuta, ó gente minha!
As areias e os seixos dos rios
Ainda estarão aqui pelos próximos séculos.
E elas devem crer que nossos guerreiros
Souberam agir com mente firme e mão generosa.
(4)
Nem Cristo nem Guevara. Nem Buda nem Maomé.
Nem Ocidente ou Oriente.
A salvação é criar um tempo definitivo.
Agitar! Lutar! Sangrar!
Não vamos mendigar aos pastores da mentira
A idéia de um Deus de bordel.
Para que essa cegueira? Nós somos o Reino!
Nós somos os ouvidos da vida!
(5)
Meu verso está sendo posto à mesa
Às mãos dos semeadores da palavra.
Não deem as costas ao poema!
Não estilhacem o sangue do poema!
Não quero ver meus queridos agonizando
Sob a oratória dos corruptos e dos compradores da fé!
(6)
Lotadas as estradas com a esperança e seu verde brilhante,
Os homens golpearão seus inimigos
Dentro do mais curto espaço do tempo.
E meu espírito vestirá a pele dos libertos
Desvendando as traições dos compradores de almas.
(7)
E todos irão saber que o Senhor da Liberdade
É um Senhor que respira e vive
Na alma do homem da terra.
Ele é forte e tem seu livro sagrado
Escrito na palma de suas mãos e em sua pele enrugada.
Com os palácios derribados
Com os falsos senhores desgrenhados
O homem real da terra poderá desfrutar a vida
E aprisionar parasitas que de nada cuidam
Mas apenas solicitam a presença da morte.
(8)
Caminhemos! Caminhemos! A estrada é longa!
Vamos buscar mulheres e homens!
O Senhor da Liberdade respira
E tem seu livro sagrado escrito na pele enrugada
Dos homens tristes e pobres.
(9)
Quando o verdadeiro vento nordeste varrer o semiárido,
As fogueiras das vaidades terão de ser apagadas,
Mas acender-se-ão luzes de águas
E as chuvas ficarão plantadas
Nas almas dos guerreiros da vida.
E dos livros rasgaremos as páginas
Das histórias oficiais escritas pelos opressores.
(10)
Ah, meu verso profético! Que beleza!
Aqui chegastes para extravasar a tua ira.
Aqui estás para render homenagem
Ao homem de nossa futura Pátria Nordeste.
...............................
Canto Segundo
Profetizo o verso ainda não posto
à mesa.
E neste limiar que pretende ser
eterno
Crio marcos e marcas para todos os
viajantes
E delimito no infinito do
horizonte
A dor escondida guardada dentro
dos homens
Até alcançar este infinito cheio
de mim
............................................................................
(11)
Agora
fiquemos sós.
Ainda
temos muito tempo.
Nossos
refúgios são seguros.
Estou
olhando para a terra e nela vejo uma força radiante.
Não
preciso que você olhe para mim.
Não sou
forte nem tenho intento insidioso.
Mas não
estou assim tão adormecido.
Quero
atrair você para uma missão conjunta
Aos
momentos em que trocamos ideias e argumentos.
“Qual
será a missão?” eis a pergunta.
Olhe:
as ruas estão perigosas e os seres humanos
Têm
suas almas sonâmbulas programadas
Por
vídeos televisivos e mentiras midiáticas.
Não se
preocupe. O mundo tem conserto.
Vamos
entrelaçar nossas ideias
Como
cordas emaranhadas a amarrar os navios do porto.
(12)
Fiquemos
sós.
Tenho a
intenção de amar a sua ideia esplêndida
Nos
nascentes e nos poentes dos marcos deste planeta.
E
desejando olhar bem para dentro de mim
Você
verá minha postura de guerrilheiro
Cumprindo
um caminho evolutivo sem precedentes.
“Quem
és?”, eis outra pergunta.
Olhe:
na amplidão de todas as nossas madrugadas
Sempre
aparecem as cinzas de um outrora.
Jogo-as
pela janela do meu quarto.
Mas não
se preocupe.
Não vou
jogar fora as cinzas do amanhã.
Quero
fazê-las voar célere ao seu encontro
Como a
luz daquela estrela
Que
somente hoje alcançou a terra.
(13)
Em
verdade, em verdade vos digo:
A vida
dos melhores humanos está jogada na sarjeta
E é por
esse motivo que precisamos ficar a sós
E fazer
um estudo dinâmico daquilo que somos.
Hoje é
uma noite de agosto. Ela é fria.
A
ventania entra pela janela do meu quarto
Trazendo
os gritos dos guerreiros iguais a nós.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Somos
muito mais do que habitantes das sarjetas
E por
essa questão temos de ficar a sós
Para
recriar os sonhos dos grandes profetas.
(14)
Em
verdade vos digo:
Quando
os deuses da terra eram outros
O homem
era muito mais feliz do que hoje.
Mas
ainda há tempo para moldar uma nova mística
E para
plantar uma semente mais formosa de planta.
Por
isso temos de ficar a sós. Eu e você.
Somos
os únicos a compreender a nudez,
A
beleza, a dor, a alegria e a verdade das coisas.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Podemos
fazer o vento carregar mensagens otimistas
Para
todos os deserdados do planeta.
(15)
Fiquemos
sós!
Vamos
enrodilhar nossos dedos uns nos outros.
Vamos
amalgamar nossos cérebros para a luta.
Ao
longo das grandes avenidas ninguém se fala mais.
Ninguém
mais se olha para entender
As
substâncias dos rostos e dos corpos.
Esqueceram
a enxada, o martelo e a foice no arquivo morto.
O homem
hoje ri ao matar seus semelhantes
E ao
olvidar seus ancestrais
Sem
chorá-los pelas suas perdições nas multidões.
“Que
faremos?”, eis outra questão.
Nada!
Não faremos nada.
Ficaremos
sós para profetizar o novo tempo.
Ficaremos
sós para ver a verdadeira história ir e voltar.
(16)
A luz
de sua imagem na plena madrugada
É uma
condensação de paixão para meus olhos.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Haverá
um tempo em que nos encontraremos
Arrependidos
de nada termos sido
Tanto
um para o outro
E de
nada termos feito de bom do outro para o um.
Assim é
necessário ficarmos sós,
Criando
tempo de mim e tempo de você.
Tentando
ser ousados na criação e nas decisões.
Nos
palácios, os opressores de hoje riem de nossos anelos,
Mas nós
daremos rédeas à imaginação quando ficarmos sós.
(17)
Nosso
ficar a sós servirá para perturbar todo o universo.
Servirá
para acabar com as leis dos “dinossauros”.
Para
uma olhadela melhor às auroras.
Servirá
para um mergulho fundo dentro de cada poro nosso.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Iremos
implodir milhões de silêncios
E criar
novas estrelas rubras
para
iluminar nossas futuras madrugadas.
(18)
Fiquemos
sós.
“Queres
ficar a sós comigo?”
Venha
então.
Conheceremos
melhor as vitórias e as derrotas.
Nas
rugas de nossas peles saberemos quem somos,
Para
onde vamos e qual o objetivo desta missão.
Em
verdade, em verdade vos digo, ó homem simples:
O saber
dos sonhos cria em mim o dom da palavra.
O saber
das lutas cria em mim o desejo da vida.
Em
verdade vos digo: Ao ficarmos sós
Entraremos
em contato com todas as raças do mundo.
........................................
Canto terceiro
Delimito no infinito do horizonte
A dor escondida guardada dentro
dos homens
Crio marcos e marcas para todos os
viajantes
E profetizo o verso ainda não
posto à mesa.
Até alcançar este limiar cheio de
mim
Limiar que pretende ser eterno
............................................................
(19)
As
esperanças ainda estão vivas nas ruas
Apesar de os olhos dos homens não brilharem
Como nos dias de antanho.
Quase todos estão trêmulos e sozinhos e ansiosos
Apesar de os olhos dos homens não brilharem
Como nos dias de antanho.
Quase todos estão trêmulos e sozinhos e ansiosos
Um
tanto esquivos das suas realidades.
Talvez
pensem que tudo esteja perdido
E que o
reinado da dor e da morte tenha se revigorado.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Não
devemos nos esquivar daquilo que vivemos
É
preciso reunir nossas forças na beira de todos os rios
Antes
que as sombras da morte
Derrubem
a estrela perpétua do seu altar de sonho.
(20)
Meus
queridos, a Pátria Nordeste não é uma terra morta
Cheia de cactos selvagens.
Ela é a imagem dos olhos das crianças.
Cheia de cactos selvagens.
Ela é a imagem dos olhos das crianças.
Das
nossas mulheres e dos homens voluntariosos.
Não deixemos que o lampejo da bandeira rubra
Se deixe ficar agonizante nas mãos dos crentes que beijam
Não deixemos que o lampejo da bandeira rubra
Se deixe ficar agonizante nas mãos dos crentes que beijam
As
bandejas dos desvarios e das loucuras do ouro.
No
reino de dentro de cada um de nós
Não
devem existir disfarces. Em verdade vos digo:
Temos
de nos comportar como se o vento nordeste
Seja um
frêmito de guerra com garras flamejantes.
(21)
Não
somos homens imbecis nem esclerosados.
Não somos fantoches nem marionetes.
Estamos amparados uns aos outros pelo suor
Não somos fantoches nem marionetes.
Estamos amparados uns aos outros pelo suor
A
escorrer através dos poros quando trabalhamos a terra.
E
quando gritarmos juntos e unidos,
O sussurro da vitória será um trovão
Que de tão formidável
O sussurro da vitória será um trovão
Que de tão formidável
Abalará
as entranhas dos comensais da morte.
Caminhemos!
Caminhemos! A estrada é longa!
Vamos buscar mulheres e homens!
O Senhor da Liberdade respira
E tem seu livro sagrado escrito na pele amarfanhada
Dos humanos tristes e pobres.
(22)
Os
queridos que escolheram andar na outra margem
Deixaram de aceitar a realidade destes tempos.
“Ah, como é violenta essa vida!” – pensaram.
Eles entregaram gratuitamente as almas ao deus do bordel
E aos homens que usam o livro sagrado para fundar igrejas.
Foram empalhados como espantalhos e programados
Deixaram de aceitar a realidade destes tempos.
“Ah, como é violenta essa vida!” – pensaram.
Eles entregaram gratuitamente as almas ao deus do bordel
E aos homens que usam o livro sagrado para fundar igrejas.
Foram empalhados como espantalhos e programados
Para
vender a fé como um trago de cachaça
E para
roubar a moeda do bolso do pobre.
Será
contra essa nação de hipócritas que iremos lutar.
Não vamos
dizer que possuímos a voz da divindade.
Possuímos
nossa verdade e nossa fome.
Nossa
pobreza e nossa honestidade.
(23)
Em
verdade, em verdade vos digo:
O
vento nordeste está cantando solenemente o hino
Da
mais cruel realidade da nossa vida.
Que
os hipócritas fiquem longe, não se aproximem.
Nem
mais um passo deem.
Estamos
em frêmito de concepção,
Pois
somos a raça dos escolhidos.
Antes
que as águas cubram as planícies,
Em
verdade vos digo:
Antes
que a vontade dos corruptos seja cumprida
Os
brotos das árvores serão muitos mais novos
Que
as raízes postas no chão pelas mãos dos opressores.
(24)
Eis
aqui: nosso maior anseio.
Eis
aqui: nossa ideia essencial.
Eis
aqui: a explosão de nossos suspiros.
A
pétala da flor vermelha se reabre
Quando
ganhamos mais uma vez o dia
Ao
rufar dos tambores da vitória dos nossos heróis.
(25)
Qual
caminho você vai escolher, meu amigo?
Não,
nada disso.
Eu
não estou fazendo papel de místico.
Eu
sou um guerrilheiro espirituoso.
Sou
um peregrino a viver das minhas explosões verbais.
Não
vou obrigar ninguém a seguir caminhos.
Se
você prefere a derrota, siga!
Também
é muito bom sofrer derrotas.
Com
elas aprendemos o sentido da vida.
(26)
Eu
falo porque quero falar.
Gritarei
quando desejar gritar.
Faço
parte do mundo e o mundo é meu.
Os
hipócritas que nos governam não são donos do mundo.
Está
envergonhado de mim?
Que
assim seja.
Mas
em verdade, em verdade vos digo:
Ao
ficar envergonhado de mim
Você
estará mais do que nunca sendo covarde.
E
como um leproso pensando não ter cura
Esconder-se-á
nas cavernas do próprio medo.
Em
verdade vos digo:
Não
ando pelo mundo a derramar lágrimas de lástima.
Nem
vou gemer e me acovardar
Para
ganhar as honrarias dos chefetes de última classe.
(27)
E
então eu pergunto outra vez:
Quer
ficar a sós comigo?
Este
ficar a sós não significa esconderijo
Significa
guerra. Significa luta.
Significa
que iremos tocar fogo nas histórias oficiais
Escritas
pelos que se dizem donos da verdade.
Quer
ficar a sós comigo?
Mostraremos
o quanto somos válidos
E
não iremos criar leis
Para
termos desculpas a serem descumpridas.
.........................................
Canto Quarto
Crio marcos e marcas para todos os
viajantes
E delimito no infinito do
horizonte
A dor escondida guardada dentro
dos homens
Até alcançar este limiar cheio de
mim
E neste limiar que pretende ser
eterno
Profetizo o verso ainda não posto
à mesa.
..................................................................................
(28)
Eis-me
aqui na terra completamente seca...
Um rosto enrugado de homem olha para o céu
Buscando as águas da chuva.
Um rosto enrugado de homem olha para o céu
Buscando as águas da chuva.
Nas
suas pequenas e rústicas casas, as crianças
Brincam
com a sopa de suas próprias fomes.
Mas o
homem tem o olhar da esperança
Mergulhado
até o fundo da retina no horizonte.
Esperando
e contando nos dedos
Os
poucos grãos de feijão que poderá ter
Após
umas poucas gotas de água caírem por sobre a terra.
(29)
E eis
nos palácios dourados a safadeza das autoridades
Prometendo
mundos e fundos para florir a terra seca
E
preparando o corpanzil para voar
Até as
paisagens europeias,
Onde
poderá gastar o dinheiro do suor do outro.
E
desovar em algum recanto de Manhattan a sabedoria
Que
julgam apenas eles a possuir por ser governo.
Em
verdade vos digo, ó párias do dólar:
Há de
chegar o dia em que suas casas serão invadidas
Pelas
almas mais simples desta nação.
Há de
chegar o dia em que todos vocês ficarão
Olhando
tristes para os remendos
De suas
calças e de suas casacas.
(30)
A voz
dos deserdados ainda não é forte o bastante
Para
rugir o trovão da guerra nas caatingas,
Mas os
espíritos hoje são outros.
Não são
adolescentes seguindo uma coluna vermelha.
Eu
também não pretendo ser um líder.
O homem
da salvação chegará no momento certo
Marcado
há muito tempo na história da raça.
Ele
virá quando as águas dos rios
Começarem
a cobrir as praças.
Quando
o mar ocupar os vazios do espaço a ele tomado.
E ele
será muito mais que o Enviado.
Não
será um Guevara nem um Cristo.
Não
será um Maomé nem um Buda.
Será
simplesmente ele: o homem do tempo definitivo.
O homem
da agitação.
O homem
da luta.
O homem
vindo para sangrar.
(31)
Em
verdade, em verdade vos digo:
O devir
não mais será como está nos “livros históricos”
Escritos
pelas classes dominantes.
O homem
a surgir será o mais forte de todos os homens.
Beberá
terra para matar a sede.
Comerá
vento para matar a fome.
E
estará dando seu sangue a todos os companheiros
Postos
ao seu lado na perseguição da verdadeira vida.
Em
verdade vos digo:
Ele não
vai enveredar pelos ardilosos caminhos
Da
história oficial escrita pelos vendilhões dos templos.
(32)
Portanto,
querem ficar a sós comigo?
Ao pé
de qualquer rocha deste nosso Nordeste
Esculpida
pelo vento rebelde das fronteiras
Veremos
o verdadeiro significado do tempo.
A
palavra medo será riscada do dicionário.
E nunca
mais iremos enveredar pelos labirintos
Engendrados
pelos ladrões da inocência
Para
dar uma ilusão de vida aos nossos filhos.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Será
para sempre e será logo.
Ele
virá a nós para o povo voltar a ser pescador dele mesmo.
Ele
estará ao nosso lado designando como será a luta
Para
aprisionar os homens que dizem possuir a voz de Deus
E que
vendem ilusões como se vende cachaça.
Ele chegará para extravasar a ira mais honesta.
E para render tributo ao homem do Brasil nordestino.
(33)
Marcos
e marcas.
Vermelha é a cor das almas dos homens
Enxada e martelo e foice centenárias
Na espera da ressuscitação.
...............................
Canto Quinto
Para todos os viajantes e
caminheiros
A dor escondida fica no infinito
do horizonte.
Cria marcos e marcas no limiar
cheio de mim
Até alcançar o vazio que pretende
ser eterno
Profetizando o verso ainda não
posto à mesa
Escondido dentro das almas dos
homens
....................................................................
(34)
Eis que ele está chegando:
O homem do tempo definitivo!
O homem da agitação!
O homem da luta!
Em verdade vos digo:
Ele vem para agitar as almas e ganhar o dia.
No grande encontro dos rios da cidade
Encaminhará ao fundo do oceano as dores
E as tristezas dos menos aquinhoados.
E nos abismos abissais fará naufragar
As estratégias dos governos opressores.
Eis que ele vem: definitivo como a morte.
(35)
E você que por aqui passa, qual será o rumo a escolher?
Você diz não possuir rumo e caminha
Como se a vida estivesse escrita desde seu nascimento.
Em verdade, em verdade vos digo:
A vida vai começar a ser escrita no futuro
E você deverá fazer parte dessas escrituras
Ao lado da maior força jamais vista na terra.
Não tenha medo e não tenha vergonha.
São teus filhos que necessitam de espaço
E de novos verdes e de lares mais calmos.
(36)
“Para que isso?” - pergunta o pobre de espírito.
“Eu já tenho o que preciso e
nada devo aos outros
E meus filhos retratam a
minha vida.
Para que esse místico homem
definitivo?
Tudo que construí eu fiz e
nada mais.
É necessário deixar de
curtir o realizado?”
Em verdade vos digo, pobre humano ignorante,
Não há misticismo no homem definitivo.
Ele é o que é e o que são todos.
Ele não é o retrato da lástima nem da miséria.
E muito menos covarde para se esconder
Por detrás dos ombros dos exploradores da terra.
(37)
Ah, quando os queridos da Pátria Nordeste
Empunharem o mastro do emblema do homem
A terra irá tremer desde o Itapecuru ao Capibaribe.
E então será tarde para os crentes tomarem tento
De tudo que foi dito e ficou escrito há antanhos.
Em verdade, homens da terra, eu vos digo:
Será criado um vácuo aos pés dos opressores
E grandes caminhos de salvação para os oprimidos
O chão será de lama para muitos.
E de podridão para outros.
Mas os escolhidos serão os enérgicos
A fincar com teimosia a bandeira da luta
Pela grandeza da vida.
(38)
Nossa será a terra. Nosso será o reino absoluto
Ao lado do emblema rubro da vida.
Serão nossos os rios e as vegetações das margens.
E poderemos possuir todos os recursos minerais
E lavrar em prata e cobre nossas próprias moedas.
Porém, o homem definitivo não terá efígie
A ser desenhada em notas monetárias.
Ele será a imagem permanente de todos os homens
E mulheres e crianças e animais e plantas.
Em verdade vos digo, verdugos da vida:
Chegará o tempo em que subirão ao cadafalso
E aos gritos verão suas cabeças entregues aos carrascos.
(39)
E os hinos de força sairão das gargantas libertadas
Ressoando por toda a extensão da pátria
Do Itapecuru à desembocadura do Capibaribe.
“Sou o predestinado para
traduzir a nova língua.
Os sabores da liberdade
estão em mim e sobre mim
E os oferto para vocês,
queridos da terra.
Os horrores dantescos dos
infernos serão entregues
Aos infiéis e aos habitantes
dos grandiosos palácios”.
Em verdade vos digo, em verdade proclamo:
Os hinos de força da vitória maiúscula
Sairão das gargantas dos mal vestidos e dos famintos.
E serão traduzidos em uma nova língua
Dentro das noites nordestinas,
Das grandes luas cheias e das brilhantes estrelas.
........................................
Canto Sexto
Escondido dentro das almas dos
homens
Profetizo o verso ainda não posto
à mesa
Crio marcos e marcas no limiar cheio
de mim
Até alcançar o vazio que pretende
ser eterno
E para todos os viajantes e
caminheiros
Trago a dor escondida no infinito do horizonte
............................................................................
(40)
Todos deverão ficar a sós comigo
Quando os rios e o mar levarem de roldão as terras
E quando os grandiosos palácios na ruína
Desabarem para sempre no lodo e na lama.
E aquele que virá com a amplidão da noite
Ou a da aurora
Terá uma imensa multidão para escutar
Seus hinos de guerra e de liberdade.
Em verdade vos digo, homens simples:
Ele trará a permanência da agonia para os donos do ouro
E para os homens que vendem a fé como cachaça.
E o deus que estará ao seu lado terá parecença
Com a verdadeira imagem dos humilhados e perseguidos.
(41)
Eu sou apenas a voz a clamar no deserto de hoje
Para mostrar aos homens o tempo a vir
Não sou aquele conjugado no pretérito
Sou apenas a voz a gritar do meio das caatingas
A mesma coisa que vocês poderão ver e dizer
Aos filhos e aos netos e os netos aos filhos.
Pois a história irá marcar o homem definitivo
No que ele sempre é e no que sempre será.
Ele é o tempo futuro a abrir portas e janelas
A todos os futuros tempos dos homens.
(42)
Ao chegar perto dos escolhidos a voz retumbará:
“Sou aquele pelo qual o
sangue do Nordeste do Brasil
Pediu com urgência à
majestade superior.
Sou aquele que possui a
noite amarrada ao dia.
Eu sou o que sou. Homem e
poeta peregrino.
Guerrilheiro e abençoada
matriz do mundo.
Eu vim e vou e não passo.
Estou aqui para matar a sede
de justiça
Estou aqui para alegrar os
desafortunados.
Em verdade vos digo: eu vim,
vou e continuo indo.
Sou a emoção verdadeira e o
rubi brilhante
Da bandeira empunhada pelos
corações dos homens”.
(43)
E aos opressores e aos corruptos virá o clamor:
“Valerá a pena ver minha chegada bem de
perto.
Valerá a pena ver os vossos jardins com as
flores murchas.
Eu sou o incriado que saiu
Dos parafusos das vossas fábricas
E das fumaças poluidoras.
Sou o redivivo da vingança
E vim trazer a vós outros a agonia absoluta.
Minha espada está sendo colocada à prova
Desde algumas centenas de anos, ó infiéis.
E agora que cheguei aos vossos jardins
Não haverá perdão para os marasmos e para
o cansaço.
Eu sou aquele a quem o beijo da traição
republicana
Molhou as ruas com o sangue dos meus
inocentes.
Eu vim. Eu vou. Eu não passo.
Sou o homem definitivo para rir de vossos
remorsos”.
(44)
“Tirarei a paz de espírito dos governos
gananciosos.
E ninguém mais em toda a confusão das
galáxias
Tornar-se-á partícipe da inclemência dos
corruptos.
Eu vim. Eu vou. Eu fico e não passo.
Sou o imortal a viver dentro das casas de
taipa.
Sou o espírito redivivo das árvores
derrubadas.
Sou a mente elementar da terra nordestina
Assaltada e violada pelos vendedores de
deuses
E pelos ditos grandes filósofos visitantes
de Manhattan.
Vou mostrar quanto valho. Verão meu
entendimento
No expirar do vosso mundo e na chegança do
reino
Permanente dos famintos e deserdados”.
(45)
Depois,
ele não mais irá precisar revogar palavras.
Os
crepúsculos serão de todos, bem como as tardes,
E as
manhãs e as noites quentes ou frias.
Depois,
ele não mais precisará repetir a voz
Deste
cantador que profetiza nas caatingas a sua vinda.
Em
verdade vos digo: ele será a palavra e a voz finais
Para
decidir e revisar todos os horários do reino.
Será a
mulher mais bela e desejada da pátria
E o
homem másculo e enérgico em busca da vida.
Eu
digo: ele habitará os becos e as vielas escuras
E será
uma luz a iluminar o coração dos homens
Eu
digo: Ele foi, é e será o homem definitivo
A empunhar
a bandeira da liberdade e da vida.
(46)
Na espera da ressuscitação.
Martelo e enxada e foice centenárias.
Marcos
e marcas.
Vermelha é a cor da liberdade dos homens.
.....................................
Canto Sétimo
Do infinito do horizonte trago a
dor escondida
E profetizo o verso ainda não
posto à mesa
No limiar cheio de mim crio marcos
e marcas
E alcanço o vazio que pretende ser
eterno
Para todos os caminheiros e viajantes do mundo
Escondidos dentro de suas almas de homens
.........................................................................................
(47)
Eis o
clamor daquele que profetiza nas caatingas:
Em um tempo não muito mais longe que um tempo
Todos irão conhecer a todos sob as matizes
Em um tempo não muito mais longe que um tempo
Todos irão conhecer a todos sob as matizes
Das
vermelhidões dos crepúsculos e das auroras.
Eis o
clamor definitivo da nossa raça!
Eis o
clamor profético vindo dos leitos secos dos rios:
A vida
de cada um será julgada pelo ganho e pelo roubo
E o
homem e a mulher nascidos na miséria...
E o
homem e a mulher que não possuem terra...
E o
homem e a mulher sem face corruptora...
Terão
lugar ombro a ombro, mão a mão,
Junto
ao homem definitivo.
(48)
E a
terra deixará de pertencer
Aos canalhas
e às suas corjas.
Os
padres e pastores vendilhões da fé
Deixarão
de violar as mentes.
E os
herdeiros do homem definitivo alcançarão o topo
E
agitarão para o resto do mundo a cura do câncer maligno.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Os
humildes não sobrevivem nos dias de hoje
Porque
existe um grande câncer corroendo a República.
Em
verdade, em verdade vos digo:
Hoje a
escravidão do homem tem outro nome
Escrito
nos dossiês de RH
Dos
gananciosos patrões.
(49)
As
vozes dos humildes tomarão outros rumos
Lado a
lado, mão a mão com o homem definitivo.
Eu vos
digo: os dias serão medidos com calma e vagar.
Os
governos pagarão caro a desdita do homem da terra.
Eis o
clamor do profeta das caatingas:
O maior
mentiroso é quem deseja desgovernar o país!
Esse é
um cancro hereditário vindo da raça dos cabrais.
Cancro
que precisa ser extirpado com urgência,
Juntamente
com os outros cancros da mentira
A se
esconder nas vestes ornamentadas das religiões.
Padres
mentem.
Pastores
mentem para o bem dos cofres das igrejas.
(50)
O que
devemos fazer com essa gente que não nos respeita?
Precisamos
com urgência retirar do arquivo morto
A
foice, o martelo e a enxada.
Precisamos
ressuscitar a cor vermelha da liberdade
Estes
serão os futuros e grandiosos marcos da vida.
Em
verdade, em verdade vos digo, ó homens simples:
Não
será mais necessário fazer a marcha de uma coluna.
Todos
estarão ombro a ombro, peito a peito, mão a mão.
Com a
ideia concreta do homem definitivo
Trazendo
do infinito do horizonte a dor escondida
Para
todos os caminheiros e viajantes do mundo.
(51)
Valerá
a pena retirarmos a cabeça dos travesseiros.
Comprimir as ideias dos gananciosos numa bola de papel.
Valerá a pena dizer:
Comprimir as ideias dos gananciosos numa bola de papel.
Valerá a pena dizer:
“Estou dizendo isso, porque assim deve
ser.”
“Estou fazendo assim para que meus filhos
possam viver.”
Valerá a pena cortar a voz dos políticos pela raiz,
Valerá a pena cortar a voz dos políticos pela raiz,
Antes
que comecem a colocar
Emblemas
de promessas em nossos ouvidos.
Valerá
a pena dizer: “Não! Isso é mentira. Vocês
mentem!
A única verdade está conosco e dentro de
nós.
E essa verdade é nosso reino”.
Em
verdade vos digo, ó homens humildes da terra:
Nós
ressuscitaremos nossa ideia
Como se
ressurgindo de entre os mortos
Mas nem
mortos estávamos e nem mortos estaremos.
Retornamos
para o cumprimento da ação final
E
valerá a pena ver a chegada do homem definitivo
Dentro
dos corpos de todos
Os
homens e mulheres do mundo.
(52)
Eu já
vos disse e mais uma vez repito:
Meus
queridos,
A Pátria
Nordeste não é uma terra morta
Cheia de cactos selvagens.
Ela é a imagem dos olhos das crianças.
Cheia de cactos selvagens.
Ela é a imagem dos olhos das crianças.
Das
nossas mulheres e dos homens voluntariosos.
Não deixemos que o lampejo da bandeira rubra
Se deixe ficar agonizante
Não deixemos que o lampejo da bandeira rubra
Se deixe ficar agonizante
Nas
mãos dos césares que beijam
As
bandejas dos desvarios e das loucuras do ouro.
No
reino de dentro de cada um de nós
Não
devem existir disfarces.
Em
verdade vos digo, mais uma vez e outra vez:
Temos
de nos comportar como se a alma do Nordeste
Seja um
frêmito de guerra com garras flamejantes.
...................................
Canto Oitavo
No limiar cheio de mim crio marcos
e marcas
E alcanço o vazio que pretende ser
eterno
Do infinito do horizonte trago a
dor escondida
Para todos os caminheiros e viajantes do mundo
E profetizo o verso ainda não
posto à mesa
Escondido dentro das almas dos homens
..............................................................................
(53)
Está
perto o momento em que
Os
arquivos de RH dos gananciosos
Receberão
a visita daquele que nunca veio,
Mas
que sempre está e sempre renasce.
Ele
irá rasgar as atas e os estatutos
Das
mentiras oficiais que regem a ideia dos salários.
Porque
o homem definitivo sabe:
A
escravidão nunca acabou sobre a face da terra.
Apenas
ganhou outro nome e outro eufemismo.
Agora
a escravidão é chamada de emprego
E
quem lucra são os vendilhões dos templos.
E
quem zomba do homem da terra
São
os patrões e os corruptores da nossa verdade.
(54)
Bem-aventurados
aqueles que acusam.
Bem-aventurados
os que ousam dizer:
“A história escrita da pátria é uma
grande mentira.
É a lavagem dos cérebros para o uso das
máquinas.
É o beneplácito dos governos para o uso
do dinheiro
Ganho pelo suor dos homens da terra
durante séculos.”
Estes
estarão lado a lado com o homem definitivo
Quando
ele quebrar as correntes e libertar os escravos
E
rasgar as atas e os estatutos das mentiras oficiais.
E,
ainda: Bem-aventurados aqueles que sofrem
Por
não possuírem casas de pedra para abrigar os filhos.
Também
serão herdeiros da ideia. Eles farão o reino
Brilhar
como a luz solar alimentando o oxigênio da terra.
(55)
E o
profeta das caatingas continua seu clamor:
Mentiroso
é quem busca o desgoverno!
Mentiroso
é quem eleva um deus
Aos
altares dos templos em busca do ouro dos pobres.
Eles
são muitos. Mas são covardes, ímpios e corruptos.
Matam
para calar o verbo. Assassinam a verdade.
Mas
eu vos digo, ó homens simples:
A
ideia do homem definitivo será a salvação da pátria.
E
ela virá cedo ou tarde, ainda que o sol deixe de nascer
Ou
a lua seja desviada para outros recantos do universo.
Em
verdade vos digo: A única salvação é esta ideia.
E
ela está escrita nas palmas das mãos dos humildes.
(56)
E
mais uma vez repito. A voz ressoará o clamor
A
ser ouvido do Itapecuru ao Capibaribe:
“Eu vim. Eu vou. Eu fico e não passo.
Sou o imortal a viver dentro das casas de
taipa.
Sou o espírito redivivo das árvores
derrubadas.
Sou a mente elementar da terra nordestina
Assaltada e violada pelos vendedores da fé
E pelos ditos grandes filósofos visitantes
de Manhattan.
Vou mostrar quanto valho. Verão meu
entendimento.
No expirar do vosso mundo e na chegança do
reino
Permanente dos famintos e deserdados”.
(57)
“Não sou Cristo. Não sou Guevara.
Não sou Maomé. Não sou Buda.
Não sou Oriente. Não sou Ocidente.
Sou Norte e Nordeste.
Sou o espírito do grande chefe de
Canudos
Redivivo nas almas e nos olhares dos
famintos.
Eu chego. Eu vou. Eu passo. Eu fico e
transmito
A glória de cada um possuir o que merece
E repartir com o outro aquilo que ao
outro falta.
Recebo com carinho todos os
bem-aventurados,
Todos os que acusam os vendilhões.
Estarei lado a lado com os sem-teto
Bem-aventurados são esses homens de bem
Que não roubam o suor do outro nem a
vida do irmão.
Todos estes farão parte do reino que há
de vir
Todos farão o Belo Monte das cidades
libertas.
E cedo ou tarde estaremos nas
culminâncias,
Quando o mar cobrir os grandes
arranha-céus
E quando os rios ocuparem seus leitos
roubados.”
(58)
“O vazio se encherá de mim e eu serei
todos.
O verso estará posto à mesa para matar a
fome.
A dor escondida desaparecerá no
horizonte.
E os marcos e as marcas do mundo serão
outros,
Pois nascerá um novo céu e uma nova
terra
Anseio antigo a viver escondido nas
almas dos homens.
Já estou entre vocês, ó meu povo,
Já estou voando entre vós, queridas
aves.
Beijo minhas arvores e deito em meus
campos.
Aceitai o meu retorno. Aceitai minha
vinda.
Vinde aos meus braços, meus queridos da
pátria!
Vinde para meu lado, homens sem-teto!
Vinde até mim, pequeninos artesãos!
Não há vitória sem luta e as batalhas
serão muitas.
A guerra não acabou em 1897.
Os tabuleiros nordestinos
ainda estão banhados em sangue.
Vinde a mim, guerreiros voluntariosos!
Eu sou o homem definitivo.
E vocês serão os definitivos homens e
mulheres
Donos dos rios e das planícies.
Serão os definitivos a apascentar no
futuro
Os animais e as plantas que habitam o
céu e a terra.
Está escrito!
Assim seja!”
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