I
Só a leve esperança
em toda a vida
Disfarça a pena de
viver, mais nada;
Nem é mais a
existência, resumida,
Que uma grande
esperança malograda.
O eterno sonho da
alma desterrada,
Sonho que a traz
ansiosa e embevecida,
É uma hora feliz,
sempre adiada
E que não chega nunca
em toda a vida.
Essa felicidade que
supomos,
Árvore milagrosa que
sonhamos
Toda arreada de
dourados pomos,
Existe, sim: mas nós
não a alcançamos
Porque está sempre
apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde
nós estamos.
II
Eu cantarei de amor
tão fortemente
Com tal celeuma e com
tamanhos brados
Que afinal teus
ouvidos, dominados,
Hão de à força
escutar quanto eu sustente.
Quero que meu amor se
te apresente
— Não andrajoso e
mendigando agrados,
Mas tal como é: —
risonho e sem cuidados,
Muito de altivo, um
tanto de insolente.
Nem ele mais a
desejar se atreve
Do que merece; eu te
amo, e o meu desejo
Apenas cobra um bem
que se me deve.
Clamo, e não gemo;
avanço, e não rastejo;
E vou de olhos
enxutos e alma leve
À galharda conquista
do teu beijo.
III
Belas, airosas,
pálidas, altivas,
Como tu mesma, outras
mulheres vejo:
São rainhas, e
segue-as num cortejo
Extensa multidão de
almas cativas.
Têm a alvura do
mármore; lascivas
Formas; os lábios
feitos para o beijo;
E indiferente e
desdenhoso as vejo
Belas, airosas,
pálidas, altivas...
Por quê? Porque
lhes falta a todas elas,
Mesmo às que são mais
puras e mais belas,
Um detalhe sutil, um
quase nada:
Falta-lhes a paixão
que em mim te exalta,
E entre os encantos
de que brilham, falta
O vago encanto da
mulher amada.
IV
Eu não espero o bem
que mais desejo:
Sou condenado, e
disso convencido;
Vossas palavras, com
que sou punido,
São penas e verdades
que sobejo.
O que dizeis é mal
muito sabido,
Pois nem se esconde
nem procura ensejo,
E anda à vista
naquilo que mais vejo:
Em vosso olhar,
severo ou distraído.
Tudo quanto afirmais
eu mesmo alego:
Ao meu amor
desamparado e triste
Toda a esperança de
alcançar-vos nego.
Digo-lhe quanto sei,
mas ele insiste;
Conto-lhe o mal que
vejo, e ele, que é cego,
Põe-se a sonhar o bem
que não existe.
V
Alma serena e casta,
que eu persigo
Com o meu sonho de
amor e de pecado;
Abençoado seja,
abençoado
O rigor que te salva
e é meu castigo.
Assim desvies sempre
do meu lado
Os teus olhos; nem
ouças o que eu digo;
E assim possa morrer,
morrer comigo
Esse amor criminoso e
condenado.
Sê sempre pura!
Eu com denodo enjeito
Uma ventura obtida
com teu dano,
Bem meu que de teus
males fosse feito".
Assim penso, assim
quero, assim me engano
Como se não sentisse
que em meu peito
Pulsa
o covarde coração humano.
Pulsa covarde o coração humano...
ResponderExcluirParabéns também por este excelente poema.
Um abraço
Irene
Ainda cá voltei porque este poeta infelizmente já falecido
ResponderExcluirtem um post sobre ele em
https://portogente.com.br
para quem estiver interessado.
Um abraço
Irene
Agradeço pelo seu comentário. Vou visitar esse blog.
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