segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

SONETO DE TODO O CORPO LAVADO – Marcelino Botelho

 

Ao longo das margens, acerquei-me
Do rio, que em minhas botas assentou.
Busquei, assim, as suas rotas, de joelhos,
Lavar o cansaço como se lavam as gaivotas 

E os olhos de quem chorou, como lava o inverno.
Ali, o corpo rompeu-se pus e ventania
Para além dos dias e das mãos que imitavam o inferno.
Tomando-o da água, que não embacia.

Menos até que isso: da água-mão que o embalsamava
E a ungia; mesmo assim, o corpo, como um rio, seguia.
Vestia-se de água e de vento, por fora e por dentro;

E cada momento girava seu carrossel de espumas
E trazia à terra todo o pasto das chuvas.
As coisas todas como um inventário imenso!

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