sábado, 4 de maio de 2019

QUEIXA – Valdeci Ferraz

De que vale me endeusares
Se fores incapaz de compreender os meus conflitos?
De que vale desejares o meu corpo
Se as nossas almas não estão conectadas?
Navegas em um oceano cujas águas
Eu não tenho o direito de me banhar.
De que vale dizer que me amas
Se me dás a solidão como companhia
Nas noites em que as corujas crocitam
Agourando a morte de entes queridos?

De que vale erigir altares
Se já não há oferta para o sacrifício?
Em alguma esquina, na areia da praia, em uma rua,
Uma praça, um cinema qualquer,
Deixamos cair um pedaço de nós.
E os coveiros de plantão o sepultaram
Por isso, muitas vezes, divagamos como zumbis
E acordamos como dois desconhecidos.

Entre os troncos abandonados de uma mata
E banhados pela luz da lua solitária ousamos
Desafiar os deuses e plantar uma árvore.
Hoje contemplamos seus galhos desfolhados,
Seus frutos jazem distantes levados pelos pássaros
Que se alimentam de sonhos.
De que vale entoar uma canção
Se insistires em ouvir apenas o canto das sereias?
No teu desvario confundes as estrelas com os planetas
E fazes do nosso leito uma lápide tumular.

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