terça-feira, 29 de maio de 2018

ODE A JOVEM LUZ - Eliseo Diego

Tradução de Alai Garcia Diniz

Em meu país a luz
é muito mais que o tempo, demora-se
com estranha delícia nos contornos
militares de tudo, nas relíquias
enxutas do dilúvio.
A luz
em meu país resiste à memória
como o ouro ao suor da cobiça,
perdura entre si mesma, nos ignora
desde seu alheio ser, sua transparência.

Quem corteje a luz com fitas e tambores
inclinando-se aqui e ali conforme a astúcia
de uma sensualidade arcaica, incalculável,
perde seu tempo, argúi com as ondas
enquanto a luz, ensimesmada, dorme.

Pois em meu país a luz não vê
as modestas vitórias do sentido
nem os finos desastres da sorte,
mas se entretém com folhas, passarinhos,
caracóis, clarões, intensos verdes.

E é que cega a luz em meu país deslumbra
seu próprio coração inviolável
sem saber de ganhos ou de perdas.
Pura como o sal, intacta, erguida,
a casta, demente luz desfolha o tempo.

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