terça-feira, 10 de agosto de 2021

A MINHAS SOLIDÕES VOU... – Lope de Vega

 

Tradução de Fernando Mendes Vianna
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A minhas solidões vou,
de minhas solidões venho,
porque para andar comigo
me bastam meus pensamentos.

Não sei o que tem a aldeia
onde vivo e onde pereço,
que não posso vir mais longe
porque venho de mim mesmo!

Nem bem nem mal vou comigo;
mas diz meu entendimento
que um homem que é todo ele alma
no próprio corpo está preso.

Entendo quanto me basta,
e somente não entendo
como se sofre a si mesmo
um ignorante soberbo.

De quantas coisas me cansam,
facilmente me defendo;
porém não posso guardar-me
desses perigos de um néscio.

Ele dirá que eu o sou,
porém com falso argumento;
que humildade e necessidade
não cabem num só sujeito.

A diferença conheço,
porque nele e em mim contemplo
a loucura da arrogância,
a humildade em seu desprezo.

Ou sabe hoje a natureza
mais que soube em outro tempo,
ou tantos que nascem sábios
é por força de dizê-lo.

Eu só sei que não sei nada,
disse um filósofo, sendo
sua conta a humildade,
onde o que é mais é o menos.

Não me gabo de entendido,
por desditado me tenho;
pois os que não são ditosos,
como podem ser discretos?

Não pode durar o mundo,
pois dizem, e assim o creio,
que soa a vidro quebrado
e que se quebrará presto.

São os sinais do juízo
ver que todos o perdemos,
alguns por carta de mais,
outros por carta de menos.

Disseram que antigamente
a verdade foi-se ao céu:
tal a puseram os homens
que não se lhe viu regresso.

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