domingo, 15 de agosto de 2021

ELEGIA DA BRUMA - Álvaro Moreyra

 

Réquiem do pôr-do-sol... A tarde ajoelha e canta,
num mistério augural de cinza e de ouro vivo...
E o hospital, sob a tarde, entre árvores, levanta
o seu vulto de pedra, estranho e pensativo...

Ao incenso do ocaso, a paisagem parece
movimentar-se, orando, em gestos musicais...
É o silêncio que entoa harmonias de prece
com a ignota orquestração dos mudos vegetais...

Passos batem a estrada... E pela estrada, agora,
seguem ranchos buscando o sossego das casas...
Desaparecem... Vão... E ao misticismo da hora,
no ar silente, em quietude, andam saudades de asas...

A escuridão aumenta... E há vozes... algazarras...
Das águas-verdes cresce um rouco cantochão...
Trilam grilos... E ao alto, as primeiras cigarras
despertam, respondendo... Aumenta a escuridão...

Súbito, em derredor, tudo se cala... E adiante,
ermo, queda o hospital como quem está ouvindo...
O plenilúnio surge, em êxtase, distante,
branco, a Terra a abençoar... Vai subindo... subindo...

E à alva bênção da luz, os contornos avultam
na precisão da linha — hartos, a destacar...
Começa a noite... E o sono... E os sonhos que sepultam
a tristeza da vida aos que podem sonhar...

E quando a claridade, em chapa, de repente,
cai sobre a frontaria, e a asperge, e a envolve, ondeando,
geme um órgão lá dentro, enevoado, dolente,
como se fora o luar que estivesse tocando...

A alma da Terra fala à vibração da Terra...
Espasmos de sofrer!... A dor a sete tons!...
E ascende... e afunda... e ecoa... e pelos longes erra
um ritmo nebuloso, onde há sombras de sons...

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