segunda-feira, 29 de março de 2021

TRANQUILO EM UMA NOITE TRANQUILA – Charles Bukowski

 

Tradução de Renata Bastos
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Sinto que estou ficando gordo,
velho e estúpido.
Eu reclamo colocando os meus sapatos.
Não sei se me restam anos, meses, semanas,
dias ou se o último minuto está chegando.
Esta garrafa de 1983
di Saint Emilion grand cru classe
ainda faz tocar o maldito gongo.
O que me faz evitar ficar
com as mãos nos bolsos
junto com os outros velhotes
que compartilham memórias rasas.
Nem os jovens ajudam muito,
são apenas espelhos brilhantes sem reflexo.
A morte se senta em uma cadeira
de frente à mim e observa.
A morte vê, mas não há olhos.
A morte sabe, mas não há alma.
Muitas vezes nos sentamos juntos à noite.
A morte ainda tem uma carta na manga.
Eu, nenhuma.
Este é um vinho excelente.
Conecta-me ao infinito.
Um homem sem vinho
é como um peixe sem água,
um pássaro sem asas.
O vinho escorre no sangue do tigre
e dentro de mim.
Com a morte não tenho igualdade.
Só posso vencer uma vez.
A morte se levanta da cadeira
e fica atrás de mim.
É uma linda noite.
Alongo uma mão e puxo
um cabelo comprido do meu antebraço.
Coloco-o próximo ao cigarro
e observo-o se esvair para longe.
Estou pronto.
As árvores lá fora estão em silêncio,
nada mais, nada menos.

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