Na meia luz do picadeiro
 do nosso circo, antes que cheguem,
 os que serão nossa plateia,
 nossa penumbra interna pulsa
 da sua própria intensidade
 por sobre o chão de pó de serra.
 
 Que pensarão aqueles todos
 que vão chegar, portando angústia,
 da angústia vã dos nossos números?
 Nem saberão que nós sabemos
 que eles também morrem de angústia,
 que são convivas da miséria,
 do mesmo modo que nós somos.
 E que eles têm, como nós temos,
 a sua volta, um outro circo,
 de um toldo azul, de azul intenso.
 
 Na corda bamba, dançaremos,
 como um prodígio de equilíbrio,
 mas todos eles, que nos olham,
 na corda bamba também vivem.
 Se a nossa veste é a do palhaço
 trazendo o riso a nosso circo,
 é bom lembrar que também eles
 que não se pintam da pintura
 que em nossos rostos ostentamos,
 por muitas vezes são palhaços
 no enorme circo em que pelejam.
 
 Em nosso sangue o pó de serra
 geme e soluça, e rasga a carne,
 se somos mímicos (ou trágicos...).
 Mas quanta vez eles são gesto,
 trágico gesto, se lhes calam
 a voz, impondo-lhes silêncio.
 
 Nossa libré de domador
 será de um circo noutro Circo.

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