A POESIA de Abílio Terra Júnior

A PALAVRA

soa
como um rio
um murmúrio

um tom acima

um crepitar
de lamas
um desvelo

um farfalhar
de escovas

sons guturais
de um cego que
enxerga o fim

mãos
que se apertam
acolhem a bênção

se cruzam
no escuro
gritam no gozo

cismas de velhos
crianças calam
massas ululam

a língua úmida
o dente tenso
cordas canoras
......
PARÁBOLA DOS SOLTEIROS

os solteiros se contam aos milhares
eles moram em seus quartos úmidos
rodeados de fotos de mulheres nuas
e de revistas vídeos e CDs eróticos

batem suas próprias gemadas e omeletes
e piscam os olhos
para a vizinha do lado “mamãe delícia”
enquanto ela cuida dos seus filhos
que brincam no playground

eles se telefonam
e riem dos casados gordos
que trabalham de sol a sol
para darem sustento às suas famílias

no “Dia do Solteiro” eles se reúnem
em uma grande praça
e festejam frenéticos a sua liberdade
e promiscuidade
bebem centenas de tonéis de chope
e ao fim do dia embriagados
se lançam nas águas de um grande rio
onde despencam em uma cachoeira
brilhante e purificadora

os sobreviventes são recebidos com alegria
às margens do grande rio
pelas mãos ansiosas das moças casadoiras
algumas belas outras nem tanto

poucos meses depois
estão todos casados