quarta-feira, 8 de julho de 2020

OUTRO NASCIMENTO - Forough Farrokhzad

Tradução de Thaís Chagas
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toda minh’alma é canto obscuro
que te atravessa
que te carrega à aurora
da eterna evolução e florescer
neste canto te sussurro, ah
neste canto te cubro
de árvore
de água
de fogo

talvez a vida seja
uma longa rua onde uma mulher
com uma cesta caminha todos os dias

talvez a vida seja
uma corda com que um homem
que se enforca num galho
talvez a vida seja uma criança
que volta da escola para casa

talvez a vida seja
o acender de cigarro do fumante
que repousa entre dois amantes
ou o olhar vazio de um transeunte
que levanta seu chapéu a outro transeunte
com um vazio sorriso e bom dia

talvez a vida seja
aquele momento íntimo
quando meu olhar
se destrói nas pupilas
dos seus olhos
com a sensação
que me uno a percepção
da lua
e a recepção da escuridão
noturna,

numa sala
grande como a solidão
meu coração
grande como o amor
olha aos simples pretextos
de sua felicidade
ao murchar das flores
nos vasos
a muda que você plantou
no nosso canteiro
ao som dos canários
que cantam para janela, ah

este é meu terreno
este é meu terreno

meu terreno é
um céu que me tomam
com o cair das cortinas
meu terreno é
a queda de uma escada
abandonada
que se recupera entre
a podridão e a nostalgia
meu terreno é
o caminhar triste ao jardim
das memórias
e morre com pesar da voz
que me diz
eu amo tuas mãos

plantarei no jardim minhas mãos
germinarei - eu sei, eu sei, eu sei
e as andorinhas ovos botarão
nos buracos dos meus dedos sujos
de tinta

colocarei brincos de cereja
nas minhas orelhas
colocarei pétalas de dália
nas minhas unhas

há um beco onde
os meninos que me amavam
ainda têm cabelos bagunçados,
pernas magras e pescoços finos
e pensam nos sorrisos ingênuos
de uma menina
que uma noite foi soprada
pela ventania

há um beco onde
meu coração foi roubado
das ruas de minha infância

a jornada de um tipo de linha do tempo
cobre a linha do tempo com o tipo
um tipo consciente da imagem
que retorna com prazer do espelho

e é dessa maneira
que alguém morre
e alguém permanece

não há pescador que pérola ache
num riacho
feito poça de tão vazio

conheço uma pequena fada triste
que mora no oceano
e tão sutilmente
toca seu coração
na flauta mágica
uma pequena fada triste
que morre com um beijo
toda noite
que renasce com um beijo
toda aurora

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