quarta-feira, 1 de setembro de 2021

DOIS POEMAS - Tasso da Silveira

CATA-VENTO

Cata-vento, lá no alto,
capta o mundo nos ventos.
O mundo das geleiras brancas,
dos desertos dourados,
das cidades aflitas, das montanhas, do mar.

Cata-vento, lá no alto
capta as horas nos ventos.
As horas, no orbe, simultâneas
mas tão infinitamente diferentes:
horas, aqui, da seara amanhecente,
horas, ali, da torre ensolarada,
horas, além, de cais na noite triste,
horas, por toda a parte,
de nascer ou morrer.

Cata-vento lá no alto
longe do chão impuro
capta os ventos que vem.
Ah, cata-vento não escolhe vento.
Todo vento lhe traz desejo e sonho,
todo o vento lhe traz beleza e mágoa.
Sim, cata-vento não escolhe vento
capta os ventos que vem,
mesmo os trêmulos ventos sonambúlicos
das solidões estagnadas
sem sombra de ninguém.
.............
FRONTEIRA

Há o silêncio das estradas
e o silêncio das estrelas
e um canto de ave, tão branco,
tão branco, que se diria
também ser puro silêncio.
Não vem mensagem do vento,
nem ressonâncias longínquas
de passos passando em vão.
Há um porto de águas paradas
e um barco tão solitário,
que se esqueceu de existir.
Há uma lembrança do mundo
mas tão distante e suspensa...

Há uma saudade da vida
porém tão perdida e vaga,
e há a espera, a infinita espera,
a espera quase presença
da mão de puro mistério
que tomará minha mão
e me levará sonhando
para além deste silêncio,
para além desta aflição.

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