domingo, 10 de abril de 2022

TRÊS POEMAS de Flávio de Araújo

 

CRIANÇA MORTA
(ao quadro de Cândido Portinari)
........
Fim cruel de toda pureza.
Ó fome no ventre dos homens.
Ó espinho nos pés das mulheres.

Criança que aqui brincava
de valente herói voador
e não brinca mais.
Para voar
na dimensão inalcançável
longe das moscas e monstros
que sempre derrotava.

Alva
mais alvas nuvens
esconda a criança
nesse esconde-esconde eterno.

Infância
poder dos homens.
Inimaginável crença de um mundo
que se mostra ingrato
com seus valentes.

Ó fome no ventre dos homens.
Ó espinho nos pés das mulheres.
Fim cruel dos heróis voadores.
.....................
SHIIILÊNCIO

A necessidade de silêncio
Leva o dedo riste a boca
E não é o silencio que procuro.

O dedo que chia na boca
Traz consigo
Batom vermelho-guelra.

Agora eu sei.
Dos afagos
O silêncio é o mais obsceno
..................
QUINHÃO

À mesa, como num tribunal
sob o juízo de nossa mãe
disputávamos, com fervor,
os melhores pedaços
da magra galinha.

As irmãs menores,
cada qual com suas asas,
balbuciavam qualquer coisa
de bom
voando entre os dentes.

O impasse era sempre
com as coxas.
Duas
para três admiradores.

Fora o confronto
tomei predileção
por peitos.

O que Freud explicaria
com a teoria das perdas.

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