terça-feira, 3 de maio de 2022

LÉGUA LONGA – Fabrizio Morelo

 

não faço
nunca fiz
a procura do inteiro
não desprezo o pedaço

se o que chega primeiro
é só morte ou cansaço
sempre resta em sobejo
pro defunto a cachaça
para o gado o bagaço

sobra um verso
amassado no maço
dos poemas que nunca fiz
que fala dos tortos canteiros
onde o tropeço é um passo
que foi de encontro à raiz
vida inteira
(agorinha)
não corro
não mato
porque a vida
no seu fino trato

a meu juízo
ou mero fato
por desaforo
por desacato
não vale a bala
nem paga a sola do sapato

de tão vadio, virei poeta
cheguei tardio
cria indireta
dos que tem frio
do que não presta
do canto vento
desse assobio
que vem da fresta

nem bem pacato
nem bem pateta
só tenho e trago
o que me afeta
a légua longa
esse caminho
que, de tão deserto e estreitinho,
só me atravessa
por ser sozinho

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