quinta-feira, 18 de novembro de 2021

QUATRO POEMAS – Jorge Canese

 

Tradução de Adalberto Müller
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FOMOS MURCHANDO

Perdemos a saúde
e nos brotaram brotoejas
grandes como melancias a ponto de estalar.

A maleita e seus acólitos
nos minaram o sangue,
nos carcomeram os ossos,
nos infectaram irremediavelmente o cérebro,
o coração das tripas,
as mãozinhas ternas-suaves.

Perdemos a terra, a água,
perdemos o ar, o vento, a alegria.

O nosso fogo foi apagando
pouco a pouco, murchando:
e faz tanto tempo que não chove!
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O QUE FICA PRA NÓS

Todos os dias
se inauguram cemitérios.
Vivemos cavando sepulturas.
O contrabando de lápides e caixões
é a última moda.

Ninguém quer morrer
sem uma reza,
sem seu panteão último modelo.

Tudo entra de forma clandestina.
Tudo é gringo, tudo importado,
menos o medo
que continua sendo autóctone.
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UMA FORMA DE DIZER

Ontem sonhei com as moléculas,
com edifícios, com o vento norte
e com os raros poros da tua pele.

Ontem sonhei contigo.
Eram os átomos do infinito
querendo te dizer pequenas coisas:
como que beijos são isso e nada mais
e às vezes não sabemos o quê,
que os sorrisos, os olhos,
as mordidinhas
são uma forma de a gente se gostar,
uma forma de dizer
que já não sabemos o que será o amanhã.
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DEMÔNIOS

Os demônios faziam turnos, obedientes.
Subiam e desciam
aparentemente sem lógica.

Demônios precisos e bonitos,
desses que sabem engordar
a esperança dos pobres.

Demônios brancos,
demônios corados
como o fogo eterno
que nos tenta e nos queima.

Demônios espectrais,
Demônios carcereiros,
escuros de muito amanhecer.
Utopistas enfim
e cheios de boas intenções.

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