quinta-feira, 24 de março de 2022

TRÊS POEMAS de Dante Milano

 

CANÇÃO BÊBEDA

Estou bêbedo de tristeza,
De doçura, de incerteza,
Estou bêbedo de ilusão,
Estou bêbedo, estou bêbedo,
Bêbedo de cair no chão.

Os que me virem caído
Pensarão que estou ferido.
Alguém dirá: "Foi suicídio!"
"É um bêbedo!" outros dirão.

E ficarei estirado,
Bêbedo, desfigurado.

Talvez eu seja arrastado
Pelas ruas, empurrado,
Jogado numa prisão.

Ninguém perdoa o meu sonho,
Riem da minha tristeza,

Bêbedo, bêbedo, bêbedo,

Em mim, humilhada a glória,
Escarnecida a poesia,

Rasgado o sonho, a ilusão
Sumindo, a emoção doendo.

E ficarei atirado,
Bêbedo, desfigurado.
.................
TERRA DE NINGUÉM

A sala recende
A terra molhada,
A caule úmido e raiz apodrecida.

As flores sobre o cadáver
Contraem pétalas enregeladas.
A figura de cera no caixão bordado
Sorri como um cego sorri
Com ar de náusea.

Os convidados expandem uma tristeza festiva.
O defunto recusa
Qualquer comunicação com a humanidade
Que lhe é de todo indiferente agora.
(Ele que morreu "pela Causa" e recebe honras fúnebres.)

Em sua torre de marfim,
Sob o céu absoluto da paisagem devastada,
Reina, altivo. (Há coroas, há bandeiras na sala.)

Passante! descobre-te e não rias,
Respeita a morte e o fedor de sua glória.
...............
AO TEMPO

Tempo, vais para trás ou para diante?
O passado carrega a minha vida
Para trás e eu de mim fiquei distante,
Ou existir é uma contínua ida
E eu me persigo nunca me alcançando?
A hora da despedida é a da partida

A um tempo aproximando e distanciando...
Sem saber de onde vens e aonde irás,
Andando andando andando andando andando

Tempo, vais para diante ou para trás?

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