sábado, 26 de março de 2022

POEMAS de Onévio Zabot

 

MÃOS

As mãos que tratam o gado,
apanham nuvens nas noites de chuva
e enfrentam tormentas nas horas de solidão.

Sagrada são as mãos do pastor,
do laçador que boleia o laço
e movimenta rebanhos por campos de trigo.

Sempre haverá mãos
prontas para o abraço dos desesperados
ou para evocar a fuga de leões marinhos.

Mãos que buscam anjos,
atraem sonhos de jovens cortesãs
no largo leito de núpcias.

Mãos que levam naves pelo espaço,
que trazem estrelas
e as espalham nos lagos e cisternas.

Mãos que apenas querem,
desvendar vias por praias desertas,
pondo o mar no caminho das ondas.

Maior que nossos sonhos,
todos os dias sentimos o rosto
preso entre as mãos,

Sentimos o corpo queimar,
arder em busca do sol,
onde repousam nossas mãos.
...........
VELEIROS DE PAPEL

Há no ar uma sede
ferindo a alma dos pescadores,
roendo barcos
e velas em lance de rede.

O homem pelas sebes
Caminha,
recolhendo estrelas
entre as mãos - no céu.

Nas ribanceiras,
crianças empalmam rios,
plantam neve nas colinas
em brancas tendas de areia.

O cansaço dos inocentes
põe pedras nos olhos,
fere de morte os covardes,
desmonta velhas embarcações.

Se nada segues
pouco vale o destino,
a morte cavalga veloz
sempre a caminho.

O homem vive
de pescar o tempo:
ora em veleiros de papel,
ora em veleiros de vento.
.....................
PEIXE

Cristalino, o peixe
navega entre retinas,
no arremesso das águas.

Há um matiz
inventado em azul e verde:
um amarelo pingente.

Igual flecha,
desenha no perfil das águas
as cores do dia.

O peixe como a ave
navega na luz,
frágil e refratária.

Entre o caminhar
do homem, e o vagar do peixe,
não há distância.

Ambos se entreolham,
em longas viagens,
por espelhos oblíquos.

No tempo do mundo,
- lagos e mares e rios -
há um lugar comum de navegar.

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