sábado, 18 de dezembro de 2021

DESESPERANÇA – Júlia da Costa

 

Que céu formoso, que natura esta!
Tantos fulgores vem turbar minh' alma!
Meu Deus! se a vida é para uns tão calma
Por que p' ra mim ela é tão negra e mesta!

Em magos risos despertando a aurora
A flor do prado seu aroma exala!
Eu também vejo-a despertar... que fala
Soltarei d' alma que o passado chora?

Ávida e negra! Nenhum astro ameno
Derrama luz que lhe afugente a treva!
Quero sorrir-me! mas a dor me leva
Do peito aos lábios um saudoso treno!

Vejo floridos para o seu noivado
Os laranjais, e a natureza inteira...
É tudo festa! na mimosa esteira
Da veiga amena, no florente prado...

Mas a esperança que dourou minh'alma
Da minha vida na estação da infância
Agora à tarde, já não tem fragrância
Que possa dar-me ao dessossego calma!

E a natureza tem eterna festa!
Da f´licidade nela vê-se a palma!
Meu Deus! se a vida é para uns tão calma
Por que p'ra mim ela é tão negra e mesta?!

Dos verdes lustros na dourada aurora
Por entre rosas nos sorri a vida!
Mas de meu sonho é a ilusão perdida!
E geme o peito, enquanto a alma chora!

E a lira ali no laranjal cheiroso
Pendida a um galho se acalenta em prantos!
Ave chorosa dos passados cantos
Nem ouve o eco no vergel formoso!

E a rosa branca do gentil valado
Se às vezes diz-lhe um amoroso voto,
Ela suspira, e no futuro ignoto
Só vê a imagem do cruel passado!

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